Por não ser um serviço voltado ao consumidor final, o
contrato de fomento mercantil (factoring) não se sujeita às regras do
Código de Defesa do Consumidor (CDC). A Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) entendeu que se o serviço é usado na cadeia produtiva, uma empresa
não pode alegar ser mera consumidora. A decisão foi dada em recurso movido por
empresa dentística de Brasília.
A empresa propôs ação de contestação
contra supostas cláusulas abusivas do contrato por ela firmado para aquisição de
créditos, assessoria creditícia e acompanhamento de “carteira de contas”. As
cláusulas ofenderiam o CDC, pois deixavam apenas ao arbítrio da instituição de
fomento vários itens do pacto. O Judiciário do Distrito Federal, todavia, não
acatou a contestação.
A empresa odontológica recorreu ao STJ, com a
alegação de que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em Ação Declaratória de
Inconstitucionalidade que há incidência do código consumerista em processos
envolvendo instituições financeiras. O relator do processo, ministro Luis Felipe
Salomão, rebateu esse argumento e salientou que as empresas de fomento mercantil
não se encaixam no conceito legal de empresas financeiras.
Factoring e instituições financeiras
O
ministro Salomão destacou que o Banco Central (BACEN) não regula o
factoring, e que seus operadores, de maneira diversa dos bancos, não
captam recursos de terceiros, mas empregam recursos próprios. Essa, acrescentou
o relator, é a jurisprudência já fixada na Corte. Ele também ponderou que o
acordo entre as empresas “em nada se distancia das diversas modalidades do
contrato de factoring”.
A empresa alegou também que, conforme
dispõe o artigo 3º do CDC, haveria relação de consumo uma vez que toda e
qualquer atividade financeira se amolda no conceito. Mais uma vez, o ministro
Salomão não aceitou o argumento, pois o artigo 2º do mesmo código define
“consumidor” como a pessoa física ou jurídica que utiliza o produto ou serviço
como destinatária final. “Sob esse enfoque, desnatura-se a relação consumerista
se o bem ou serviço passar a integrar a cadeia produtiva do adquirente, ou seja,
for posto à revenda ou transformado por meio de beneficiamento ou montagem”,
esclareceu.
O magistrado reconheceu a possibilidade da equiparação ao
consumidor final, prevista no artigo 29 do CDC e, conforme vários precedentes do
STJ, se demonstrada a vulnerabilidade diante do fornecedor. Porém a empresa
dentística não se encaixa nesse perfil. “Com efeito, verifica-se que a recorrida
não se insere em situação de vulnerabilidade, porquanto não se apresenta como
sujeito mais fraco, com necessidade de proteção estatal, mas como sociedade
empresarial, que por meio de pactuação livremente firmada, obtém capital de giro
para operação de sua atividade”, concluiu. A Quarta Turma acompanhou o voto do
ministro Salomão de forma unânime.