A prostituição é causa de perda do poder familiar? E da guarda do filho?
Por Adriano Ferriani
Nos últimos dias, a imprensa divulgou
amplamente a morte do empresário Marcos Matsunaga, em São Paulo, assassinado e
esquartejado por sua mulher, Elize Matsunaga.
Do casamento, adveio uma única filha,
atualmente com um ano de idade. Elize era prostituta e conheceu o marido, homem
abastado, no exercício de sua profissão, pela internet.
Segundo noticiado, uma das razões
para o cometimento do crime foram as constantes ameaças, feitas por Matsunaga,
de divórcio e exposição do passado meretrício da mulher, para justificar o
pedido de guarda da criança.
As notícias instigam algumas
indagações.
O passado de prostituição da mãe (ou
do pai) constitui elemento suficiente para atribuir a guarda do filho menor ao
outro genitor, em caso de divórcio? Como o juiz deve decidir sobre a guarda em
situações como essa?
Quanto à guarda de filhos, a lei
11.698, de 13 de junho de 2008, inovou ao determinar que, não havendo acordo
entre a mãe e o pai, deve ser aplicada, sempre que possível, a guarda
compartilhada (art. 1584, parágrafo segundo, do CC).
Embora seja mais uma lei com
propósito elevado, na prática nem sempre a guarda compartilhada é a melhor
opção. Os conflitos constantes entre os progenitores do menor muitas vezes
contaminam a saúde psíquica da criança de forma ainda mais nefasta.
A maturidade dos pais, para não
utilizar a criança como arma, de defesa ou de ataque, na relação entre eles é
fundamental em qualquer situação. Mas, na guarda compartilhada, isso parece ser
mais importante, pois os pontos de contato e, consequentemente, de desavenças,
são potencialmente maiores.
De qualquer modo, o juiz tem espaço
confortável, pela letra da lei ("sempre que possível"), para atribuí-la ou,
diferentemente, optar pela guarda unilateral. O interesse que deve preponderar é
o do menor. Nesse sentido, a guarda deve ser conferida ao genitor que revelar
melhores condições para exercê-la.
Melhores condições não são sinônimo
de dinheiro. A lei expressamente põe em destaque o afeto nas relações com o
genitor e com o grupo familiar, a saúde, a segurança e a educação (art. 1583,
parágrafo segundo, do CC). Todos esses fatores devem ser considerados em
conjunto, não havendo hierarquia entre eles.
Por tudo isso, a resposta à primeira
pergunta deve ser negativa. O fato de a mãe ter se prostituído no passado não é
fator determinante para a guarda ser atribuída ao pai em eventual disputa.
A análise suscita outra dúvida, que
não tem a ver com o caso citado, mas sim com o título do presente texto: e se a
prostituição é atual? Tal fato seria autorizador da perda da guarda? E do poder
familiar?
O Código Civil, no art. 1638, dispõe
que uma das causas da perda do poder familiar é a prática de atos contrários à
moral e aos bons costumes. Alguns autores exemplificam o comando legal
exatamente com a prostituição.
Entretanto, tal artigo de lei deve
ser interpretado em harmonia com outros princípios, mormente aquele que prioriza
sempre o interesse do menor. A prostituição da mãe que prejudica a criança
porque exercida, por exemplo, nos aposentos domésticos, pode sim acarretar a
perda do poder familiar e, consequentemente, da guarda. Principalmente se
estiver associada a outras condutas nocivas (drogas, alcoolismo, etc). Se, de
outra forma, a prostituição é exercida como se fosse outra profissão qualquer,
com discrição e ampla preservação psíquica do menor, não há razão para destituir
a mãe (ou o pai, se ele se prostituir) do poder familiar.
Não se pode utilizar o instituto da
perda do poder familiar como forma de punição do genitor que pratica atos
contrários à moral ou bons costumes. Ainda que infringindo os deveres
matrimoniais. O primeiro interesse é o da criança. A prostituta, apesar da
profissão, pode educar a criança com valores éticos muitas vezes mais nobre do
que o outro genitor que tenha profissão regulamentada.
Sobre isso, é importante lembrar que
o Código Civil de 2002, diferentemente do que constava da lei do Divórcio (lei
6.515 de 26 de dezembro de 1977), não priorizou a guarda da criança em benefício
do cônjuge inocente na dissolução do casamento.
Em conclusão, a interpretação mais
adequada para o art. 1638, inciso III, do CC, que admite a perda do poder
familiar se houver atos contrários à moral ou aos bons costumes, deve sempre
levar em consideração o efetivo ou potencial prejuízo da criança. E não
simplesmente a conduta descontextualizada da relação de maternidade ou
paternidade. Do contrário, o remédio pode ser pior que a
doença.
Adriano Ferriani é professor de Direito Civil e chefe do departamento
de Direito Civil, Direito Processual Civil e Direito do Trabalho da PUC/SP.
Fonte: http://www.migalhas.com.br
O Direito de Família segue na vanguarda e, considerar que uma mãe pode perder a guarda dos filhos por conta da atividade pretérita de prostituição é retroceder.
O artigo supra mencionado traz a questão da guarda compartilhada, que muito se confunde com a guarda alternada, eis que os pais do menor têm por si só a guarda de forma compartilhada, ou seja, ambos decidem sobre o que é melhor para os filhos. Caso haja divergência em alguma decisão, como por exemplo o tipo de instituição escolar religiosa ou laica, caberá ao judiciário decidir. E, certamente a justiça optará pelo que for melhor para a criança.
Já a guarda alternada, é objeto de decisão judicial e trata-se de dias, semanas e tempo alternados em a criança ficará sob a guarda de um dos guardiões. Portanto, diferente da compartilhada.
Todavia, o importante é que o juiz decidirá o que é melhor para a criança. Então, não é porque uma mãe foi prostituta que automaticamente perderá a guarda. Até porque, no caso em questão, o pai também afronta os bons costumes quando se enquadra no outro lado da relação, como cliente.
Ademais, aquele que tiver melhores condições em criar e educar a criança ficará com a guarda. Não se trata de condições financeiras, como bem lembrado no retro artigo, até porque os alimentos destinados ao menor são irrenunciáveis e garantidos por lei.
O Direito de Família segue na vanguarda e, considerar que uma mãe pode perder a guarda dos filhos por conta da atividade pretérita de prostituição é retroceder.
O artigo supra mencionado traz a questão da guarda compartilhada, que muito se confunde com a guarda alternada, eis que os pais do menor têm por si só a guarda de forma compartilhada, ou seja, ambos decidem sobre o que é melhor para os filhos. Caso haja divergência em alguma decisão, como por exemplo o tipo de instituição escolar religiosa ou laica, caberá ao judiciário decidir. E, certamente a justiça optará pelo que for melhor para a criança.
Já a guarda alternada, é objeto de decisão judicial e trata-se de dias, semanas e tempo alternados em a criança ficará sob a guarda de um dos guardiões. Portanto, diferente da compartilhada.
Todavia, o importante é que o juiz decidirá o que é melhor para a criança. Então, não é porque uma mãe foi prostituta que automaticamente perderá a guarda. Até porque, no caso em questão, o pai também afronta os bons costumes quando se enquadra no outro lado da relação, como cliente.
Ademais, aquele que tiver melhores condições em criar e educar a criança ficará com a guarda. Não se trata de condições financeiras, como bem lembrado no retro artigo, até porque os alimentos destinados ao menor são irrenunciáveis e garantidos por lei.
Nenhum comentário:
Postar um comentário